O dia amanheceu azul. Bem azul e frio. Trocámos todos umas palavras, tirámos umas fotografias da praxe, ajustámos os bastões e as mochilas, e cada um de nós olhou em frente, para o caminho de calhaus que ali se iniciava e
seguia ao longo do verde do vale, com a corrente do rio à esquerda, e a Nevosa e os Carris ao fundo, fora da nossa vista, apenas pressentidos no infinito. E, cada um de nós, a seu tempo, com uma inspiração mais ou menos longa, mais ou menos profunda, com os seus próprios pensamentos e reflexões guardados consigo, deu um passo em frente, pisando o caminho e ficando um passo mais próximo dos nossos objectivos desse dia.
Este foi o primeiro passo para um dia verdadeiramente magnífico. Um dia extraordinário em que, para além de ter a oportunidade de fazer algumas caches míticas, tive, sobretudo, a sorte de o fazer integrado num grupo expedicionário 5 estrelas – sob todos os aspectos.
O nosso principal objectivo era fazer a mítica "Tou às Aranhas", uma cache no pico da Nevosa, a cerca de 1560 metros de altitude, o cume mais alto do Gerês, e o mais alto de Portugal continental fora do maciço da Serra da Estrela. Um desafio bem interessante, que acabou por ser o ponto alto (verdadeiramente) de um grande percurso, com 30 kms de extensão, dividido entre 2 países - subimos por um vale em Portugal e descemos por outro em Espanha -, e com três caches pelo meio - para além da 'Tou às Aranhas', vale bem a pena mencionar a 'XXL Challenge' e a 'Mina das Sombras'.
Os primeiros quilometros do percurso levam-nos da Portela do Homem, subindo ao longo do vale do rio Homem, um percurso bem duro, em piso de cascalho rolado e solto pelo meio da vegetação, que era o principal acesso à mina do Carris, até meados do século XX. Este percurso (para o qual é necessária autorização expressa do Parque Nacional, devido à sua bio-fragilidade), desenvolve-se numa paisagem absolutamente verde e magnífica, enquadrada pelos dois pesados contra-fortes que marcam os bordos do vale, imponentes no seu castanho contrastante - e, disse-nos quem já lá tinha ido anteriormente, bastante mais seco do que o habitual.
O caminho conduzia-nos ao planalto onde estava instalada a mina dos Carris, uma exploração de volfrâmio que prosperou na Segunda Guerra Mundial, uma instalação sombria e abandonada, marcada
por poços que conduziam às suas galerias mas, também, por uma aldeia fantasma, um monumento surreal e inesperado naquele fim do Mundo. Foi aí que encontrámos a 'XXL Challenge' e fizémos a primeira pausa alargada para descansarmos as pernas (foram 2 horas e meia sempre a subir em bom ritmo, num terreno difícil) e atacarmos os reabastecimentos. Pelo meio, ainda vimos uma 'manada' de garranos, a pastar num monte sobranceiro ao caminho, a mais de 1000 metros de altitude.
Depois foi o caminho em corta-mato até à Nevosa, pelo meio de mal-definidos carreiros, procurando o melhor caminho que minimizasse os efeitos da nossa passagem e nos levasse mais rápido e da forma menos cansativa lá acima, atravessando uma selada em altitude, com o vale de um lado a levar o olhar até Pitões das Júnias e mais adiante, até ao Marão, e, do outro, para as serranias galegas do Xurés. A vista, sob uma luminosidade pouco habitual, deleitava-se com o cenário magnífico, pontilhado, ainda, por mais garranos na paisagem, e pelo rochedo da Nevosa em fundo.
Atingir o topo de uma montanha como a Nevosa é uma sensação magnífica, sobretudo para alguém que, como eu, sofre de vertigens e luta por as ultrapassar. Aquele momento foi para mim muito especial. Aquele em que não havia mais terra por onde subir, mais nen
hum degrau ou subida para vencer. Estava realmente no ponto mais alto de todos os arredores. Ali, no topo da Nevosa, rodeado de amigos que, de uma forma ou de outra, me ajudaram a ali chegar, podia realmente perceber o que estava do outro lado da montanha, podia ver todos os meandros em meu redor, extasiar-me com uma paisagem magnífica, encher os pulmões de um ar puro, livre e sem restrições. Tinha atingido o cume. E estava (e estou!!) muito feliz por isso. É que… vale mesmo a pena! Acho que é daquelas sensações que muito dificilmente podemos mesmo transmitir por palavras.
Depois, bom, depois foi abrir as mochilas e almoçar, enquanto o Paulo Henriques lia Miguel Torga (que esteve por diversas vezes aqui em cima, e que descreve profusamente a experiência) e iniciar a descida, que nos levou a passar pela esquerda do Altar dos Cabrões (outro pico famoso do Gerês), e descer para Espanha, para a 'Mina das Sombras', uma cache colocada dentro de uma galeria mineira, parente mais pequeno da Mina dos Carris - sempre, mas sempre, acompanhado pelas óptimas explicações geológicas do PH (isto, assim, é de um luxo!). Depois desta cache (onde encontrámos 2 geocachers que esperavam por nós, a Silvana e o Drager), seguiu-se uma caminhada de cerca de... 15 quilometros, praticamente planos, e em caminhos em bom estado. Só que a extensão e o adiantado da caminhada (ainda por cima, depois de uma quase directa de Lisboa), fizeram-nos chegar bem cansados ao final do percurso.
Mas, acreditem, a Nevosa, vale bem, mas mesmo muito bem a pena!
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