Não gosto nada...
Uma colecção de pequenas crónicas dedicadas a uma grande paixão de sempre: Viver essa maravilhosa aventura que é o dia-a-dia!
A 11000 metros de altitude, sobre o Atlântico, a caminho de São Paulo, a olhar para a janela do avião e a contemplar a linha de fogo no horizonte, a separar o negro da Terra e a palete de azuis do Céu, cada vez mais escuros à medida que os nossos olhos sobem, debruados por uma “estrela” (Júpiter?), uma jóia sobre veludo profundo. De cortar a respiração pela beleza.
Adeus, meu Sol – até amanhã!
Acordar às 6h da manhã e enfrentar temperaturas negativas – para fazer isso, era porque o dia à frente prometia ser grande! E era
mesmo! Depois de um pouco mais de 3 horas a percorrer as extensões ermas da Patagónia (em que me senti a cruzar um planeta diferente do meu habitual, um planeta em que lagos gigantescos se sucediam, rodeados de gelo, em que a transição entre terra nua com algumas ervas e neve se sucedia, em que víamos guanacos, seres que nunca tínhamos visto antes, tudo na luz tremulante da manhã fresca), parámos, um pouco antes do destino. O objectivo? Tirar umas poucas fotografias ao lago e ao glaciar Viedma, mesmo à nossa frente, e ao imponente Monte Fitzroy, esse gigante sul-americano. Uma paisagem de cortar a respiração!
Depois, chegámos a El Chaltén – a capital do trekking argentino (segundo ela própria se designa). E não é difícil perceber porquê. Apesar de no Inverno a vila estar meio abandonada (duvido que tenha os apregoados 5000 habitantes; nem rede de telemóvel havia!), percebe-se que, em alturas mais agradáveis, deve borbulhar de vida de mochila às costas. Antes de mais, assim que chegamos, o autocarro leva-nos até ao escritório do Parque Natural, onde recebemos mapas, respondem-nos a perguntas e dão-nos um briefing – “Os caminhos nas montanhas têm muita neve que congelou e, por isso, estão muito escorregadios. Tenham muito cuidado e, se não têm bastões, façam apenas os trilhos mais fáceis”. Ou seja, depois de ouvir esta explicação, ficou o caminho decidido.
Cruzámos a vila a andar (ainda demorou algum tempo), com a minha mochila carregada de comida (assim, se eu
me perdesse do grupo, era em quem tinha os víveres…) e, depois, seguimos por um caminho longo e bem marcado, ao longo do vale do rio que seguia a nossos pés. Um rio com um leito largo, típico de rios de alta montanha, preparado para receber toda a água que vem por aí abaixo dos glaciares e das neves das montanhas no degelo – mas, agora, em pleno Inverno, reduzido a menos de metade
uma fabulosa cascata de mais de 20 metros de altura, numa floresta, a precipitar-se das alturas por entre gelo e a cair num pequeno lago debruado a neve. Soube que nem ginjas!
Depois, foi voltar para trás, pelo mesmo percurso e, cruzando novamente a vila, entrar num outro trilho, que subia a um pequeno monte sobranceiro a El Chaltén. Aqui, a caminhada e a subida foram feitas na neve, com muito cuidado para não escorregar e cair – o que teria sido uma má experiência de algumas dezenas de metros… E, no final do trilho, um espectacular mirador (“Dos Condores” como lhe chamam), com vistas soberbas para El Chaltén, os rios que os atravessam e para os Andes que ali começam, incluindo para os espectaculares Cerro Torre e Fitzroy. A cache que ali estava, foi um prazer – mas, sobretudo, um bom complemento!
Gostei de El Chaltén! Aliás, adorei a Patagónia, esta região dos glaciares. Acho que vou ter que cá voltar, se tiver oportunidade!
“Não me queres vender as tuas botas?”. Confesso que estava à espera de (quase)
tudo, menos desta pergunta do meu guia, enquanto me apertava os crampons à entrada do Perito Moreno. Acho que, de certa maneira, ele apercebeu-se que as botas eram claramente mais especializadas que a pessoa que as calçava…
Era a primeira vez que calçava crampons. Tínhamos que o fazer, para poder entrar no glaciar e caminhar sobre o gelo- Era a maneira de nos abrir um novo Mundo, feito de branco em diversos tons de azul, vales escarpados e montanhas íngremes – não fazia ideia que um glaciar era assim tão acidentado!
Andar com crampons exige habituação. Exige que nos lembremos de que o truque é cravar bem os ‘pregos’ no gelo, bater com o pé com força para garantir que ficamos agarrados. Obriga que nos lembremos também que, assim, o pé fica menos móvel, que a nossa passada tem que ser mais vertical. E, depois, os pequenos truques – descer apoiado mais joelhos do que nos calcanhares ou tornozelos, manter o pé direito para garantir o máximo de apoio (para a frente, os crampons têm 8 pregos, mas, de lado,
corremos o risco de nos torcermos sob o efeito do nosso peso e, lá vai um ligamento do pé…), acreditar que não vamos escorregar.
Não deu para brincar como os nossos guias, mas, para mim, foi uma excelente introdução – e, para o final, acho que a pessoa dentro das botas já se aproximava um pouco mais do nível delas…
Sigam o link, para verem uma incrível reportagem fotográfica de José Ferreira, numa lixeira nos arredores de Maputo...